Sexta-feira, 29 de Abril de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 33)

33

 

Em Moura, num meio pequeno, tudo quanto se passava era do conhecimento geral. A importância dada as situações era de acordo com as personagens envolvidas. Está claro, que o caso da Juíza com o marido, não podia passar desapercebido. No entanto, o julgamento popular, absolveu Irene.

- Ele era uma pessoa sem carácter!. … Um valdevinos da pior espécie!. … Tanto tempo, aqui sem fazer nada, a viver à custa da mulher!. … O gajo, era mas é um chulo!. … A doutora é que “os” teve no sítio ao correr com ele!. … Para mim subiu na consideração!. …

Isto é um exemplo das inúmeras conversas de café, e não só, em torno do caso. Irene, soube de algumas e ficou reconhecida.

Enfrentar a nova situação, foi fácil para Irene, depois de passar o ano que passou com Jorge. Foi uma lição de vida!... Não perdeu o seu carácter forte!. Continuou determinada e combativa. Tornou-se menos fria e menos calculista. No fundo aprendeu a viver. Dimensionou o seu modo de vida ao ordenado, que não era nada pequeno. Arrumou as ideias e seguiu em frente!....

Habituou-se a viver sozinha. Nenhum homem a procurou, mas também não era sua intenção dar-lhes abertura!... A experiência com Jorge saiu-lhe demasiado cara!... Admitiu, pela primeira vez, que os quatro anos que passou com Rafael, foram os melhores da sua vida. A pensar nisto, resolveu contactá-lo. Numa deslocação a Lisboa, procurou-o na casa onde já tinham morado juntos. Soube, então que estava alugada. O inquilino sabia que o senhorio se tinha ausentado para longe, mas não sabia onde. O contacto com ele era o mesmo endereço que tinha deixado a Irene: Um Apartado. Os inquilinos do prédio, disseram-lhe o mesmo!... Em última tentativa ainda enviou uma carta para o Apartado. Uma carta muito pequena. Tão pequena, que mais parecia uma mensagem: “… Estou livre e vivo sozinha … confesso, que depois do que passei tive saudades tuas ... passei contigo o melhor tempo da minha vida… se pudesse voltar atrás, certamente tudo seria diferente … Estou á tua disposição, se ainda quiseres…..”. Não teve resposta. 

 

~~~~

 

Entretanto passaram-se três anos. No Alentejo já estava há oito. Ali fez a sua carreira profissional. A sua competência foi reconhecida. Subiu os dois graus na escala da Magistratura permitida em tribunais desta dimensão. Subir mais só se concorrer a tribunais com outra envergadura. E, foi o que fez. Concorreu á comarca de Lisboa a qualquer vaga que houvesse. Foi imediatamente colocada. Ao fim dos três meses, obrigatórios, de acompanhamento do substituto, mudou-se definitivamente. Deixou saudades em Moura e ela própria sentiu a nostalgia da partida. Afinal, foi ali que passou os melhores momentos da sua vida e que a sua carreira profissional mais se desenvolveu. Em toda a sua vida, jamais esqueceria aquela terra.

Em Lisboa a sua ascensão foi bastante rápida. A sua capacidade de trabalho e a facilidade na estrutura Judicial, permitiram-lhe em cinco anos chegar a Juíza Relator e colocada no Supremo Tribunal de Justiça. Aos quarenta e um anos de idade chegou ao topo da carreira. Manteve-se ali até à aposentação.

O Supremo, era muito diferente dos Tribunais de Instância. Normalmente lidava com acções de recurso. Acções julgadas em Tribunais de Instância e que voltavam a ser julgadas a pedido dos respectivos réus.

Exercia funções, há cerca de um ano, quando começou a analisar um pedido de recurso. Tinha a ver com uma farmácia, dois médicos e um laboratório. Ao ler a secção de identificação dos intervenientes, o seu coração, deu um pulo. O nome “Carlos Grave” foi a causa. Verificou de imediato a origem do pedido, o que não era seu hábito, e confirmou o pressentimento: Era da Guarda e a farmácia era a dos Graves. – Olá!. Não é, mesmo, coincidência de nomes!. … Com que então os senhores em apuros!. … Como vou gostar de ver a cara da Sra. Dra. Eunice!. – Pensou e continuou a ler o processo.

A vontade de Irene foi vingar-se. Tinha-os na mão. Era tão fácil arranjar argumentação para os “crucificar”, se quisesse. – Não. Não me vou aproveitar do cargo para vinganças!. … Vou passar o processo!. … Mas, não desperdiço a oportunidade de dar uma lição à megera!. – Decidiu Irene.

Falou com um colega e expôs a situação, omitindo, obviamente, o episódio que teve com aquela família na adolescência. Justificou a pretensão, com o facto de ter estudado na Guarda e conhecer os proprietários da farmácia e um dos médicos envolvidos, o que poderia, naturalmente, por em causa a imparcialidade. A justificação era mais que aceitável e o colega concordou.

A transição do processo entre Juízos era feita na presença de todos os intervenientes, uma vez que estes já tinham conhecimento dos nomes da equipa que iria movimentar a acção no Supremo. Se, no julgamento deparassem com outro Juiz, o advogado podia, legitimamente, impugnar todo o processo.

O tribunal fez a convocatória.

No dia, Irene em vez de entrar pelo acesso privado, fê-lo pela entrada principal. O objectivo era óbvio. Encarar de frente os Graves. Teve sorte. Na lateral direita do átrio, afastados dos outros intervenientes, lá estavam eles: O Carlos, a pencuda, a megera e presumivelmente o advogado. Vinte e tal anos depois, voltava a ver aquela gente. Estavam diferentes mas perfeitamente reconhecíveis. A Dra. Eunice, apoiada numa bengala, tinha perdido o seu porte arrogante!. Foi a primeira a vê-la. Chamou a atenção dos outros. Em passo apressado, interceptaram-na a meio do átrio . 

- Olá Irene!. – Cumprimentou Carlos.

- Olá filha! – Cumprimentou a Dra. Eunice

- Já uma vez lhe disse para não me chamar filha!.  Esqueceu? – respondeu asperamente Irene. Helena não disse nada. O advogado ficou espantado e viu que ali havia algo que desconhecia.

- Sabemos que tens razões mais que suficientes para nos odiares!. Mas, isso agora já não adianta!. Cada um tem a sua vida e recordar o passado não muda nada!. … Em memória do meu pai, que já faleceu, peço que nos tenhas em atenção no julgamento!. – Suplicou Carlos.

- Estás enganado!. Eu não vos odeio!. …Repito-te o que disse à tua mãe: “ Ainda bem que aquilo aconteceu!. Acho que teria nojo de pertencer à tua família” !. … Lembra-se – Disse Irene voltando-se para a mãe de Carlos.

- Dissestes isso à minha mãe? … Quando? …

- Pergunta-lhe!. Está aí mesmo ao teu lado!. … Se insistires, até, talvez consigas arrancar um segredo dessas duas!. – Espicaçou Irene.

- Não estou a perceber nada!. … A mãe tem alguma coisa a dizer?. Ou tu , Helena?

Entreolharam-se e ficaram caladas. … A cara de Helena era de pânico!. …

- Então!  … Sra. Dra. Eunice perdeu a língua?. … Da última vez que falei consigo tinha mais vontade de falar!. … De falar, não!. De amachucar, é o termo mais correcto!.

O advogado alheio ao que se passara entre eles estava perplexo. Sabia que se conheciam. O Carlos Grave disse-lhe e, até, vinha esperançado!. Mas, pelo que estava a assistir, parecia-lhe que a esperança, só na imaginação!.

- Bem!. Vamos lá acabar com isto!. … Pediste-me que tivesse em atenção o processo!. … Já lhe dei a atenção que devia dar!. … Por  iniciativa minha vai transitar de Juiz!. … - Voltou-se para o advogado e continuou – O motivo é a preservação de imparcialidade!.  Reparou que conheço os seus constituintes e eles conhecem-me. Tenho receio de, inconscientemente, não ser isenta!.

O advogado assentiu com um aceno de cabeça.

Irene aproximou-se da Dra. Eunice e muito baixinho, ao ouvido, disse-lhe: - Esteja descansada que vão ter um Juiz do vosso nível!. Sem se despedir, afastou-se em direcção ao auditório.

No auditório o Juiz continuador do processo tomou a palavra e expôs a situação. Irene manteve-se calada. Com prazer apreciou do alto da tribuna dos Juízes, a triste figura da Dra. Eunice!. – Megera!. Vês como és pequenina!. … Afinal onde é que deixaste a arrogância?. … Pobre de espírito!. – Disse para si própria.

Desta forma, o destino encarregou-se de dar a Irene a oportunidade de, sem espírito de vingança, cobrar a humilhação que sofreu daquela gente, na fase mais crítica da sua vida, a adolescência!

 

 

 

Epilogo

 

Irene, em Lisboa dedicou-se exclusivamente à carreira. Como não obteve resposta de Rafael, não deu mais abertura a homem nenhum. Ainda teve algumas insinuações, mas não deu hipótese.

A sua capacidade de trabalho e a facilidade na estrutura Judicial, permitiram-lhe subir na hierarquia jurídica rapidamente. Em cinco anos chegou a Juíza Relator e colocada no Supremo Tribunal de Justiça. Com quarenta e um anos de idade atingiu o topo da carreira e integrava o grupo dos cinco melhores juízes nacionais. Manteve-se no Supremo, durante 20 anos.

Aos sessenta anos, aposentou-se e continuou a viver em Lisboa.

 

Quanto a Rafael, estava bem. A vida na Beira era óptima. Embora vivesse sozinho, não o sentia. O circulo de amigos era grande e tinham muita estima por ele. Raramente vinha a Lisboa. Das raras vezes que isso aconteceu foi para vender o prédio aos respectivos inquilinos. Também estava prestes a vender a casa onde habitou. Nunca mais viu Irene, nem tentou. Soube que estava livre pela carta que lhe escreveu e soube do seu êxito profissional, pela televisão, quando deu uma série de entrevistas relativas a um caso que se arrastou por bastante tempo. Ficou contente!. Afinal ela fez parte da sua vida durante quatro anos, e não podia dizer que tenham sido maus!...

 

Os pais e irmão de Irene estabilizaram por Coimbra e por lá se mantiveram.

O Rui e Beatriz, economistas, conseguiram trabalho por ali. O Rui, mesmo na Cidade, a esposa nos arredores. A irmã tentou convencê-los a ir para Lisboa, alegando que tinham mais oportunidades, mas recusaram. Viviam razoavelmente e fora da confusão da capital!. Tiveram três filhos: O Rui, a Maria e a Matilde. Foram um casal feliz.

Os pais, aposentaram-se com sessenta e dois anos. Tinham uma forte ligação ao filho e aos netos. Davam-lhes toda a ajuda necessária. Dada a disponibilidade de tempo de que dispunham, aproveitaram  fazer o que não conseguiram antes, viajar!. Ficaram a conhecer, quase, toda a Europa.

 

Leonor, a amiga de infância de Irene, casou logo que terminou o curso. Conseguiu colocação no Hospital Distrital de Castelo Branco e por lá ficou. Teve uma filha. Nunca mais teve contacto com Irene e soube do seu êxito, pela televisão, tal como Rafael.

 

Os Graves perderam o recurso da acção que lhes tinha sido movida. Foram obrigados a pagar indemnizações e foi-lhes tirado o alvará das farmácias. Não ficaram pobres, mas o poder económico de que dispunham ficou, bastante, abalado.

O Carlos, nunca veio a saber da tramóia de que foi vitima. Soube, pelas insinuações de Irene, que algo se tinha passado, mas o segredo foi bem guardado. À pressão que Carlos fez à mãe e à Helena, para saber algo, obteve como resposta  que Irene era caluniosa e cujo objectivo, dela, era prejudicar a família. Carlos ficou desconfiado, mas deitou o assunto para trás das costas.

A Dra. Eunice ao se aperceber da posição de Irene, arrependeu-se do que tinha feito. Nesta altura admitiu, que Helena ao pé de Irene era uma sombra. Como já não havia nada a fazer, não o confessou a ninguém. Faleceu aos oitenta e cinco anos e manteve-se sempre a lúcida.

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Terça-feira, 19 de Abril de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 32)

32

 

O casamento com Jorge foi o inicio de um calvário que Irene nunca sonhou passar.

Nos primeiros meses de casados tudo foi maravilha!. Jorge gostou da cidade, da casa e do ambiente. Tudo foi bom, enquanto durou o estado de graça. Irene ia trabalhar e ele passeava pela cidade e arredores. Mas, em princípio, tudo tem um fim!... Só, que Jorge não conhecia esse princípio. Nem com a pressão de Irene, esse desejado  “fim” se verificou!.

- Oh! Jorge?. Quando é pensas fazer alguma coisa? – Perguntou Irene

- Fazer alguma coisa? … Eu?.

- Sim, tu!. Quem é que havia de ser!.

- Oh!. Querida! … Para já, ainda não estou adaptado!... Além disto, o que ganhas dá bem para os dois!. - Respondeu com ar de gozo.

- Ah! Sim!. Pelo que vejo, se o problema é de adaptação, vais começar lá para o dia de são nunca!.... O que ganho dá bem para os dois!. … Mas, se ganhasses algum, dava melhor!... Não achas?

- Eu acho!. … Mas tem lá mais um pouquinho de paciência!. … Em breve tudo vai mudar!. – Retorquiu Jorge com aquele ar de “coitadinho” já conhecido de Irene e que tinha o condão de a desconcertar.

- Ok!. Mas vê lá!. … Isso não é vida!.

Entretanto os dias iam passando e nada.

Por influência de Irene ainda foi procurado para determinados serviços da esfera jurídica.

- Não tens nada para me dizer? – Perguntou Irene, um dia, enquanto almoçavam.

- Sobre?

- Ninguém te procurou?

- Ah! Foste tu? … Referes-te ao individuo que quer fazer a citação à pedreira?.

- Sim. Esse mesmo!. … Acho que é um bom começo!. … Não me parece difícil!. … Se a pedreira está a ocupar terras que não lhe pertencem!. … Qual é a dificuldade em fazer uma citação?.

- Pois!. O problema não é fazer a citação. O problema, é que a pedreira não vai aceitar e o caso vai para tribunal!. …Depois: Processo, acção, audiência e tudo o resto por aí fora, como tu sabes!... Sinceramente, não me sinto com capacidade para isso!.

- Bem! Não me venhas com a história da capacidade!. Isso é treta!. Àquilo a que chamas “capacidade” eu chamo “preguiça”!. … Preguiçoso é o que tu és!. … Pelos vistos, não queres é fazer nada!. … Não tens vergonha de viver às custas da mulher?. … Incomoda-te, por acaso, a imagem que estás a dar?. …

- Oh! Irene querida!. … Não me batas mais!. … Logo que apareça outro trabalho, pego nele!. …Isso, se não for muito complicado, claro! … - Respondeu Jorge com o seu ar, de gozo, habitual.

- Como gostava de acreditar em ti!. … Há sete meses que estamos casados e não fizeste nada!. … Nem do jardim trataste!. … É que não fizestes, nada de nada!. … Ai! Jorge!. Jorge!. Esse teu comportamento está-me a fazer sentir saudades do velho!. 

Jorge ficou tenso e mudou de cor. Ficou vermelho de raiva.

- Eh! lá!. … Toma lá cuidadinho!. … Aceito, com paciência, tudo o que me tens dito!. … Mas comparares-me com o velho, é que não!. … Isso, santa paciência!. … É que nem te admito referências desse tipo, sequer!.

- Ah! É?. Tu é que tens tido paciência comigo?. … Não me admites referências!. …Então, ainda vou mais longe! . A procederes assim, nem aos calcanhares do velho chegas, quanto mais julgares-te superior!. – Disse Irene irritada.

Jorge embatucou. Tomou fôlego e contou até três.

- Bem! … É melhor pararmos por aqui!. … O, nível do diálogo está a baixar muito!. … Não é próprio de uma Juíza!. … - Disse Jorge, já com um ar de graça, na tentativa de acalmar a esposa.

- Sim!. Vou parar!. Mas, atenção: Ou mudas, ou na próxima será pior!.

Mesmo depois deste diálogo, aceso, Jorge não mudou nada. Ou melhor, mudou para pior. Ficou ressabiado com a referência a Rafael.

Com paciência, e na tentativa de mudar a situação, Irene, ainda tentou arranjar-lhe mais trabalhos. Como era de esperar não pegou em nenhum. Algumas vezes alegava falta de meios, outras desconhecimento da matéria e outras que não precisava daquilo para nada. Não se esforçava. Não fazia nada em casa nem fora dela. Passava os dias de café em café onde ás vezes arranjava sarilhos. Era provocador e pensava que podia fazer e dizer tudo por ser o marido da Juíza.  Ultimamente e com alguma frequência, chegava “alegre” a casa. Algumas personalidades, conceituadas, da cidade reparavam no comportamento de Jorge e comentavam depreciativamente. A imagem de Irene, a Juíza da cidade, estava a cair. Irene não estava a gostar!... A sua vida estava a andar para trás. Se antes de casar o ordenado era á tira, agora estava pior. - Isto não pode ser!. Tenho de acabar com isto o mais rápido possível!... – Pensou.

Não demorou muito tempo: Dias depois, a meio da tarde foi dar com ele em casa, embriagado!.. Perdeu as estribeiras e saltou-lhe a tampa. Com secura, disse-lhe:

 - Se não queres trabalhar eu também não estou para te sustentar…Quase há um ano que aguento isto e não estou com paciência para mais… É melhor pensares em mudar de poiso. Tens uma semana para decidires.

A reacção de Jorge foi inesperada: Sem dizer nada e a cambalear aproximou-se de Irene dando a impressão de que lhe ia pedir desculpa. Mas não, segurou-a com a mão esquerda e esbofeteou-a com a direita. Enquanto não se conseguiu libertar, o que foi difícil, levou uma surra que deixou as suas marcas. Logo que conseguiu soltar-se, fechou-se no quarto. Jorge tentou arrombar a porta sem conseguir. Sorte a dela.

De manhã estava irreconhecível. Quando se viu ao espelho nem queria acreditar.

– Agora vou tratar de ti, sua besta!. – Disse para consigo. Saiu de casa e em menos de dez minutos estava na secção do Ministério Público, a fazer queixa do marido, por violência doméstica.

Entretanto, meteu férias. Não era bom aparecer no tribunal naquele estado.

Jorge foi detido e presente a Juiz de outra comarca. Como era de prever a condenação não se fez esperar: Três anos de prisão e divorcio automático se a vitima assim o entendesse. A vitima assim o entendeu e o divorcio efectivou-se. Foi simples, já que a Jorge pertenciam unicamente a roupa e os objectos de uso pessoal.

Irene ficou aliviada. O seu calvário tinha terminado.

publicado por jcm-pq às 08:36
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Domingo, 10 de Abril de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 31)

 

 

31

 

Irene, quando decidiu casar com Rafael, sabia que a reacção dos pais, iria ficar longe do razoável. A menos que se enganasse!. Era maior de idade e os pais sabiam que não fazia as coisas de ânimo leve. - Pode ser que entendam que se assim decidi, foi porque vi que era o melhor para mim! – Disse para si própria. Com algum optimismo, escreveu uma, longa, carta à mãe a comunicar-lhe.

 

Espero que esta carta os vá encontrar de saúde. Eu fico ………… rbéu …… béu .………… tenho uma novidade. Depois de muito pensar, decidi casar!.

Como sabem,  a minha sorte com namorados, não tem sido a melhor. Desde traição, gozo e desrespeito, tem-me acontecido de tudo. Nestes últimos dois anos, nenhum rapaz se aproximou de mim!. É verdade que não fiz nada por isso. Dediquei-me ao trabalho e desprezei essa vertente. Perdi o contacto com os colegas e não fomentei, qualquer tipo de amizade que pudesse desencadear algo nesse sentido. Portanto, não é só a sorte, eu também sou culpada.

Entretanto as coisas mudaram. Numa acção judicial, fui designada, pela sociedade, advogada de defesa de um homem. Um homem viúvo e com mais 30 anos que eu. Simpatizamos um com o outro, no decorrer do processo, e quando a acção terminou, continuamos em contacto. Ou melhor, continuamos numa relação de pura amizade, que se desenvolveu e transformou em algo mais sério. É um autêntico cavalheiro, devo dizer-lhe!. Sempre me respeitou e …… rbéu ..……… béu …..! Conclusão: Comecei a gostar dele, gosto dele e decidi casar com ele. ….. Não pense que me deixei enganar ou embalar na conversa dele!. Não. Quem provocou a situação, fui eu!. Eu é que o tentei. ……… béu ……………… béu ……………….!. Termino com um beijinho para os dois.

 

A professora Barbara, não queria acreditar no que estava a ler. – Devo estar a sonhar!. – Só à quinta leitura viu a realidade. Ficou transtornada.

O marido ao entrar em casa, viu logo que ela não estava bem:

- Eh! pá!. Viste algum fantasma?. O que é que se passa?.

- Lê!. – Respondeu a esposa ao mesmo tempo que lhe entregava a carta.

O professor Manuel Gião, ficou passado. Tal como a esposa não acreditava no que estava a acontecer.

- A nossa menina a casar com um velho!. …Era só o que faltava! … Ela, só pode estar a reinar conosco!. …Não acredito nisto! – Desabafou para a esposa.

- Ao principio também pensei que fosse brincadeira dela!. … Mas, infelizmente não é!... É clara, quando diz que decidiu!. … E tu sabes, também como eu, como ela é!. … Quando decide, está decidido!.

- Não me conformo!.... O velho deu-lhe a volta!. … Só pode ser!. ... Temos de fazer alguma coisa!. … Ela não pode cometer tal loucura!.

- Eu também não me conformo!. … Mas, acho que não há nada a fazer!. … Ela até diz, que foi por iniciativa dela!. … Já viste os pontos a que chegou!.

- Isso diz ela!. … Vou a Lisboa!. … Tenho de a chamar à razão!.

Antes do marido determinar o dia que ia a Lisboa, Barbara escreveu uma carta à filha:

 

……………… ficamos destroçados!. …Tanta esperança que pusemos em ti. Sempre pensamos que essa noticia nos trouxesse alegria!. Afinal foi a maior das tristezas que nos destes!. ...Tanto sacrifício que fizemos!. … Vais casar com um velho?!. Quando tiveres 40 anos, divertes-te a limpar-lhe a baba?. Francamente, esperávamos mais de ti!. ……O teu pai não aceita e diz que vai aí para falar contigo!. Oxalá te consigo demover da estupidez que vais fazer!. …… béu ……… béu…………! Termino esperando que o bom senso volte à tua cabeça. Mas, toma nota: Se persistires na tua ideia, não contes conosco para nada. 

Irene não ficou surpreendida. Ficou chocada!. … - Vens cá para me demover!? Só perdes o tempo e gastas dinheiro na viagem!. – Pensou Irene, quanto à vinda do pai a Lisboa.

E de facto assim foi. O pai de Irene não a conseguiu demover. A discussão foi acesa e acalorada!.

- ……... Se é isso que queres, força!. … Daí lavo as minhas mãos!. …Mas, não contes comigo nem com a tua mãe. – Disse irado ao sair de casa da filha.

O irmão não se meteu no assunto. Preferiu manter-se afastado.

Na data prevista o casamento consumou-se. Mais modesto e discreto não podia ter sido. Só estavam os noivos e os padrinhos. Os padrinhos de Irene, foram o tio Teófilo e Tia Gracinda, os únicos familiares que, embora, não vendo com bons olhos tal casamento, respeitaram a decisão da sobrinha.

 

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Estava casada há dois anos, quando Rui decidiu fazer o mesmo. O convite apareceu de surpresa. Ficou contente. Sempre pensou que a partir daqui as coisas melhorassem. – Para castigo bastaram dois anos de relações, quase, cortadas! – Pensou.

No dia do casamento, apresentou-se em Coimbra acompanhada pelo marido.  Ninguém da família, excepto o tio Teófilo e tia Gracinda, conhecia o Rafael. Como era de esperar, causou furor a sua aparição!. Todos mantiveram uma postura digna e educadamente fizeram as apresentações!.

No entanto, Rafael causou alguma surpresa aos sogros e ao cunhado!. imaginavam um velho já curvado enrugado e, com um bocadinho de sorte, apoiado numa bengala!. Mas não!. Depararam com um homem que aparentava menos 10 anos de idade: desempenado, enérgico e se por um lado os cabelos brancos o denunciavam, por outro davam-lhe um charme especial!. … Nunca pensaram que fizessem um casal assim!. … Naquele momento a mãe arrependeu-se da atitude que tomou!. Sem o manifestar, aproximou-se mais da filha!. O pai não deu a entender nada!.

Com o casamento do Rui, os pais estavam a pensar dar uma volta às suas vidas. Aliás, já tinham decidido. Iam deixar Vale do Seixo. Já tinham ambos pedido transferência para Coimbra. A do pai já tinha sido aceite e a da mãe estava para breve. - O objectivo é ficarem perto de mim. - Informou-a o irmão.

Ao saber disto, Irene ficou contente. Procurou a mãe e manifestou a sua satisfação:

- Já sei que vêm viver para Coimbra, disse-me o Rui!. Saiba que fico contente!. … Só os dois em Vale do Seixo, acho que estavam mal!... Se, comigo, as coisas tivessem corrido de outra maneira, tinha-os convidado a ir viver para o Alentejo!. Moura não é longe da terra do pai!. Acho que ele até ia gostar!.... Mas, pronto!. Não deu não deu!. … Ficam perto do Rui. Ficam bem!. … Já agora!. Posso visitá-los?. … Por mim e o meu marido não se importa, podem ir a Moura quando quiserem!. Teria muito gosto nisso!.

- Olha filha!. Quanto a visitar-nos, podes vir quando quiseres!. Sozinha ou com o teu marido, não interessa!. O teu pai, não achará muita graça, penso eu!. … Mas, não te fecha a porta!. Quanto a irmos a Moura, nem penses!. Por mim, se calhar até ia!.... Mas o teu pai …….!. E, sozinha, também não vou.

- Respeito o que me diz!. … A partir de agora, vou-lhe escrever mais vezes!. Espero que responda!.

- Está bem!. Vou procurar responder sempre que escrevas!

O resultado foi positivo. Valeu a pena vir ao casamento do irmão. A relação com a mãe ficou melhor. Tinha esperança que com o pai viesse a acontecer o mesmo!. Mas, sabia que o pai era tanto, ou mais orgulhoso, que ela. A relação com o Rui também melhorou. Gostou da cunhada. Pareceu-lhe ser uma pessoa sensível e de carácter forte.

Regressou a Moura, com uma sensação de alívio. Sentia-se mais perto da família!.

 

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Nos três meses que mediaram a saída de Rafael e a consecução do divorcio, Irene pensou que seria uma óptima oportunidade de reatar em pleno com a família, isto é, com os pais e o irmão. O velho, que era o busílis, já estava longe e como ia casar com um homem da sua idade, parecia-lhe que estavam reunidas as condições.

Sem hesitação e com esperança, escreveu uma carta, cuidada, e, desta vez, dirigida ao pai.

 

………… passados cinco anos, reconheço que foi um erro que cometi. … O pai tinha razão!. … Acho que ainda estou a tempo de refazer a vida. Vou casar segunda vez. Agora, com um colega da minha idade, tal como era de seu gosto …… em tempos idos. Pretendo esquecer o passado e contar com a sua bênção!. Gostava que desta vez estivessem presente!. ……rbéu… … béu ……..! Termino com um beijinho para os dois. 

 

Não era bem o que Irene sentia, mas pretendeu, desta forma, dar a volta ao pai. Não era mentirosa nem tinha hábito escamotear o que efectivamente pensava. Perdoava esta, a si própria, porque não prejudicava ninguém e podia trazer algo positivo em termos de harmonia familiar.

A resposta não tardou. Só que não foi a bem a que Irene desejava.

 

………foi pena teres demorado tanto, a reconhecer um erro que nunca devias ter cometido. De facto ainda vais a tempo de refazer a tua vida e seres feliz. És nova e tens uma vida inteira à tua frente!. Desejo que assim seja e tens a nossa bênção!. Quanto à nossa presença!. … Não!... Embora, ache que é um casamento mais adequado, perdeu o encanto e a magia que teria tido há cinco anos atrás! …Acho que podes contar com o Rui, se o convidares.! Termino com um beijinho.

 

 A esperança de Irene, desvaneceu-se. – Concordo com o “encanto e magia”, mas não com a recusa ……paciência …… pelo menos tentei! – Disse alto para si própria.

Recomposta, sentou-se à secretária e redigiu o convite ao irmão.

publicado por jcm-pq às 11:01
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Domingo, 3 de Abril de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 30)

30

 

Com a frieza habitual fez a inversão de marcha, entrou na cidade e parou em frente a um café que servia refeições rápidas. Como estava com pouco tempo, pediu uma sandes de presunto com duas folhas de alface, um compal de pêssego e terminou com uma bica e um pastel de nata. De seguida, encaminhou-se para o Tribunal.

Á tarde quando chegou a casa, encontrou em cima da mesa a despedida de Rafael.

Rapidamente abriu o envelope e na meia dúzia de linhas escritas entendeu a reacção, tão pacifica, de Rafael.

Sei que ficaste surpreendida com a minha pacificidade e rapidez!. Na verdade, nunca pensei que isto durasse tanto tempo!. Sabia que a rotura se daria, quando uma das causas, que nos uniu deixasse de ter sentido: Pelo teu lado o interesse financeiro, pelo meu o interesse na tua companhia”. Confesso que ao fim do quarto ano de casamento, ainda, pensei estar enganado. Acredites ou não, senti amor por ti.

Mas, esta ilusão durou pouco tempo. As tuas ausências foram evidentes!... Percebi que havia outro!... Não sei quem é nem me interessa saber!... Admirou-me,  demorares tanto tempo a decidir!.... Não precisava de tanto, mas um ano, foi mais que suficiente para pensar e programar este final.

Em baixo fica o endereço para onde me podes contactar. Caso necessites de mim para regularizar alguma situação que tenha a ver com a nossa ex-relação; explica a situação, que eu me encarregarei de cumprir a minha parte.

Junto todas as chaves da casa. Penso que estão todas, mas não conferi!. Preventivamente, podes mudar as fechaduras!. É contigo!.

Até sempre!...

Irene leu, dobrou e voltou a meter dentro do envelope. Dirigiu-se para o escritório. Pegou numa caneta e papel e começou a escrever…

 

~~~~

 

Rafael chegou a Lisboa ao fim da tarde. Estava a escurecer. Meteu o carro na garagem e tirou as malas da bagageira. Pegou a da roupa e subiu ao primeiro andar. Tinha voltado á solidão de há cinco anos atrás. Sentiu tristeza. - A solidão é triste!. – Pensou.

- A primeira parte já está!. Correu tudo como planeei!. Agora vou jantar e amanhã continuarei com a segunda!... - Disse para consigo.

No dia seguinte comunicou aos inquilinos que se ia ausentar definitivamente para muito longe, o que dificultava a sua vinda mensal para receber as rendas. Acertou com eles depositarem-nas no final de cada mês. Deu-lhes o número da conta e o Banco, onde deveria ser feito o depósito, e o endereço para o caso de necessitarem contactá-lo. Ainda nessa tarde colocou “escritos”, na casa de habitação, para aluguer.

No dia seguinte rumou á Beira Alta. Instalou-se numa pensão em Viseu. O objectivo era comprar uma casa na sua aldeia Natal, nas proximidades desta cidade, e refazer a vida ali. Talvez a aproximação aos conterrâneos e familiares, que não via há muitos anos, ajudasse a combater a solidão. Ia experimentar. Se desse, muito bem, se não recomeçaria noutro lado. Comprar, vender ou mudar de casa, não era problema!. Mudar de sítio também não! O que interessava era acertar num que se sentisse bem!.

Num mês, comprou casa na aldeia, fez a escritura e mudou-se. A mobília era a que tinha na casa de Lisboa, que entretanto já tinha alugado. Faltava só fazer o contrato.

- Mais uma ida a Lisboa, e, pronto!... – Dizia ele para consigo.

A adaptação correu bem. Reatar a convivência com pessoas da sua criação foi facílimo. Achou mais cordialidade da parte destes do que dos próprios familiares. Estava satisfeito. A maioria estimavam-no. E, mais o estimaram, quando uma, avultada, contribuição sua, para a Junta de Freguesia, permitiu a reactivação de uma obra, de utilidade pública, que estava parada por falta de verbas.

Ao fim de um ano estava completamente integrado. Sentia-se bem!. – Se tudo continuar como agora, já acabo por aqui!. - Pensava com alguma frequência.

 

~~~~

 

Ainda, antes de sair para jantar, Irene escreveu uma longa carta a Jorge:

“…… Foi mais fácil do que eu imaginei!.. … Ele já esperava. Estava de tal modo preparado, que já foi embora!... …Vais aguardar até correr o divórcio, que me encarregarei de acelerar, e depois podes, então, vir para morar comigo!... … No fim de semana vou ter contigo!......”.

Acabou a carta, meteu-a no envelope e saiu para jantar. Até aqui tudo parecia normal. Quando entrou no restaurante, sentiu que algo não estava bem!. Faltava qualquer coisa!.. Sentiu os olhares de estranheza, pelo facto de estar ali sem o marido!... Com a maior das naturalidades, sentou-se a uma mesa, pegou na ementa e escolheu. Peixe espada grelhado foi o pedido. Rapidamente foi servida e rapidamente terminou a refeição.

Quando regressou a casa e se viu sozinha, sentiu-se angustiada!. Estava a sentir os efeitos da solidão!... - Rafael era um companheiro admirável!... Tinha as suas coisas próprias da idade, mas, no fundo era agradável!.... – Pensou em jeito de vacilação. Mas, em menos de um minuto, recompôs-se. - Irene!, Irene! Não entres em melodramas …Ainda és muito nova para ficar com um velho … Olha em frente e refaz a vida!... Não amoleças!... - Com estes pensamentos, entrou no quarto, vestiu o pijama e preparou-se para rever o processo de uma audiência que tinha pela manhã.

Na primeira semana começou a sentir as diferenças: Sem preocupações, de confecção, almoçava e  jantava em casa – Acabou – Tinha que o fazer ou ir ao restaurante; estava habituada a ter a roupa tratada e arrumada –  Acabou – Se queria tinha que ser ela a fazer; estava habituada a ter a casa limpa e arrumada – Acabou – Se queria tinha que ser ela a assumir; não se preocupava com a reposição dos consumíveis de higiene básica – Acabou – Tinha de ser ela a repor. Enfim, foram mudanças em que ela nunca pensou e para as quais não estava preparada, e, que teve de se preparar.

No fim do segundo mês com a falta dos rendimentos de Rafael, sentiu a diferença que mais lhe ia doer. Até ali vivia á custa do rendimento do marido e nunca se preocupou com contas. Rafael não se importava. A reforma e as rendas davam perfeitamente para os dois viverem bem. No final do mês sobrava pouco, quando sobrava. Mas, também não faltava nada em casa. Irene fez sempre o que quis do seu ordenado. No princípio era tão baixo que não dava para muito, mas agora era bom!...  E ela gastava tudo!... As viagens a Lisboa ficavam caras!... Agora tinha de dar para muito mais: Alimentação, renda de casa, água, luz, conservação da casa e do carro, imagem e as repetidas deslocações e estadias para estar com Jorge!... Um dia antes de receber, dizia que dava em doida: Tinha mil escudos (hoje 5 euros) e queria ir para Lisboa. Não deu. Teve que adiar!...

Em casa, confrontada com a situação caiu na realidade. Admitiu que tinha de cortar em algumas coisas, pelo menos por agora. Logo que casasse com Jorge as coisas seriam diferentes. – Pensava ela – Ele, o Jorge como advogado era capaz de se safar na comarca. Não havia muitos!... com uns jeitinhos iria ter clientela!... – Com este pensamento prometedor animou!... Colocou um LP da Amália no leitor e, melancolicamente, ouviu cantar o fado!... 

Como não podia deixar de ser o divórcio correu dentro da conformidade legal!.... Não percebesse Irene daqueles assuntos!... O casamento com Jorge foi quinze dias depois e desta vez com dois familiares próximos. O irmão e a cunhada.

Na cidade, o círculo social, restrito, que conhecia Irene não se admirou!... Na realidade já estava separada de Rafael há três meses!.

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Quinta-feira, 31 de Março de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 29)

29

 

No quinto ano de casamento a vida de Irene e Rafael complicou-se. A relação descambou. O pressentimento de Rafael concretizou-se. 

Rafael continuou exactamente na mesma. As lides da casa eram da sua incumbência. O almoço e o jantar estavam sempre prontos e a horas. A casa arrumada e o jardim tratado. Tudo estava impecável.

Quanto a Irene não foi bem assim. Começou a deslocar-se á Capital com alguma frequência, por questões de serviço. Casualmente, numa dessas deslocações, encontrou Jorge. Estava a almoçar e ele entrou no restaurante para fazer o mesmo.

- Olá, Irene!. Há muito tempo que não te via!. – Cumprimentou –  Eu também venho jantar!. Posso sentar-me ou esperas alguém?

- Não. Não espero ninguém. Senta-te.

- É verdade!. Já há muito tempo que não te via!. – Repetiu Jorge.

- Pois já!. Sabes que eu, há cinco anos que não vivo em Lisboa!

- Eu sei!. Soube que casastes e fostes viver para Moura, no Alentejo!

- Soubestes que casei?. Como é que soubestes?

- Como não te voltei a encontrar no tribunal, fiquei curioso de saber o que é que te tinha acontecido!. Para ser franco, até receei que te tivesse acontecido alguma coisa má!. Como não gosto de viver com expectativas, telefonei para os Advogados onde trabalhavas, e a senhora que atendeu disse-me o que se tinha passado!. Fiquei contente, por saber que estavas bem!. … E, triste por saber que tinhas casado!.

- Oh Jorge!. Obrigado pela tua preocupação!. … Não mereço isso! … Sei que a partir daquela altura … tu sabes … que não tenho sido muito correcta contigo!.

- Não falemos mais disso!. O que lá vai, lá vai!. … Confesso, que quando te comecei a encontrar no Tribunal, ainda tive esperança ……!. Agora é tarde!. … Bem! Mudando de assunto, Como está esse bacalhau?.

- Está uma delícia!. Podes pedir que não te arrependes!.

- Vens aqui muita vez?

- Muita vez, não!. … Só quando venho a Lisboa!. E isso acontece, para aí de quinze em quinze dias!. – Esclareceu Irene

- Ah, sim!. Nunca aqui tinha vindo, mas agora passo cá a vir mais vezes!. Pode ser que tenha sorte e te encontre!. Sempre falamos um bocadinho!.

Durante a refeição, conversaram sobre as suas carreiras. A de Jorge não ia lá muito bem!. Governava-se, mas estava desmotivado. Terminada a refeição, despediram-se. O Jorge foi para o escritório, a Irene meteu-se no carro e voltou a Moura.

No caminho, a cabeça de Irene começou a trabalhar à volta de Jorge: - Preocupou-se comigo!. …”Ainda tive esperança”!... – Pensou e repensou durante toda a viagem. Também não lhe passou desapercebido o olhar dele. Um olhar alegre e triste ao mesmo tempo. Um olhar meigo. - Bem! Isto são efeitos do encontro!... Há cinco anos que não o via!.. Isto passa!. – Pensou Irene. 

Mas não passou!. Enquanto estava em Moura, estava bem!. Mas, quando ia a Lisboa, ia desassossegada!. …Por um lado queria encontrá-lo, por outro não!. .. E foi mais as vezes que o encontrou do que não!. Isto, porque, quando estava, mais ou menos, na altura de ela vir a Lisboa, propositadamente, Jorge ia todos os dias, almoçar, àquele restaurante. Também, ele queria encontrar-se com ela.

Naturalmente, as conversas começaram, cada vez, a ser mais longas e pessoais.

- Oh Irene!. Já algum tempo que ando para te perguntar: O teu marido não vem a Lisboa?. Vens sempre sozinha?. Só respondes se quiseres e espero que não te zangues comigo!.

- Não. É raro vir. E, quando vem, vem sozinho!.

- A propósito. O que é que ele faz?.

- Está reformado!.

- Reformado?... Mas! ……Que idade tem ele?..... – Questionou Jorge surpreendido.

- Tem 60 anos!.

- O quê?. 60 anos?. Tu surpreendes-me!.  ……Não leves a mal a minha surpresa!. Mas de facto não esperava!. …Bem! Não és a primeira, nem serás a última, certamente, a casar com homens mais velhos!. – Disse Jorge a medo.

- É verdade. Coisas da vida!. É o destino!.

- És feliz?

- Bom!. …… Feliz, no verdadeiro sentido do termo, acho que não!. Não foi isto que ambicionei!. Não foi isto que sonhei!. Confesso!. …Mas olhei para o passado e o que vi?: Uma aposta, uma traição … tu e o teu gozo … e dois anos, em que nenhum rapaz se aproximou de mim!. Este, não me traiu, não me gozou e sempre me respeitou!. …… Posso não ter uma felicidade plena, mas vivo bem!.

- Quanto a mim, nem imaginas o quanto me arrependi!. Sofri por tua causa!. Deus é testemunha!. …… Mas, deixa que te diga: o destino, a vida ou não sei o quê, pregou-te uma partida! Sinceramente, acho que não merecias!.

- Não concordo contigo!. As coisas não acontecem por acaso!. Cada um tem o que merece!.

- Sim. Se calhar, até tens razão!. Eu e a minha parvoíce, também tive o que mereci!. – Concluiu Jorge.

Irene abriu-se com Jorge, o que não acontecia desde que acabaram com o namoro. Alguma coisa estava a mudar nela!.

Um dia, decidiu pernoitar em Lisboa e aceitou o convite de Jorge, para irem ao cinema. Foi o começo. Nessa noite envolveram-se.

A partir dali, começou a pernoitar com alguma frequência, alegando que as reuniões terminavam muito tarde e fazer viagens de noite era perigoso. Mais tarde até já havia trabalho ao fim de semana!... Claro que o motivo, chamava-se Jorge.

Rafael, não se surpreendeu com esta mudança de atitude. Já contava com ela mais tarde ou mais cedo. Riu-se para si próprio por, no ano anterior, ter pensado que não aconteceria. Preparou-se para o desfecho. Não lhe podia mostrar surpresa nem sofrimento. Tinha de ser forte.

 

~~~~

 

Pouco tempo depois, numa Segunda Feira, ao pequeno almoço e após um “fim de semana fora em trabalho”, Irene sem grandes rodeios disse-lhe:

- Rafael, Tenho algo para te dizer e não é nada agradável.

- Sou todo ouvidos!. – Respondeu Rafael.

- O nosso casamento já não faz sentido!. Eu estou ausente muito tempo e tu aqui sozinho!... Acho que temos de acabar com isto!...

- Como queiras!. Por mim é a partir de agora!. – Perante o espanto de Irene, continuou - Não fiques espantada… Ouviste bem… A partir de agora… As minhas condições são simples: Ficas com tudo. Arranja, entretanto dois documentos: Uma procuração que te permita mudar o contrato de arrendamento da casa para teu nome e uma declaração onde conste a minha concordância com dispensa presencial quando correr o divórcio, que eu assino, ambos, á hora de almoço. Ainda de manhã irei ao banco levantar um terço do que lá houver e cancelar o meu acesso á conta. Ficas única titular com o que restar!...

Dito isto, levantou-se e saiu da sala.

Irene ficou perplexa com a reacção de Rafael. Não esperava violência ou cenas dramáticas!. Mas, tanta facilidade!.... Até parecia mentira!.... - Melhor assim!... – Pensou ela. Encolheu os ombros, terminou o pequeno almoço e saiu. Tinha uma audiência ás onze horas.

Entretanto, o velhote fez as malas. Duas chegaram para a roupa e objectos de uso pessoal. Meteu-as no carro e foi ao banco tratar da conta, como tinha dito. Ao  meio dia já estava em casa á espera de Irene. Enquanto esta não chegou, finalizou os preparativos de acordo com o plano que já tinha idealizado há algum tempo.

Como habitualmente, Irene chegou para almoçar por volta das treze e quinze. Estranhou ver o carro de Rafael, estacionado á porta. Não era habitual!... Entrou em casa e admirou-se de não cheirar a comer; e mais admirada ficou quando não viu a mesa posta!

- Então!. Hoje não almoçamos? – Perguntou após o cumprimento habitual de “boas tardes”

– Fui ao Banco como tinha dito e atrasei-me mais que o previsto. Não tive tempo de o fazer. Terás que ir fora ou ajeitares-te com o que aí houver!... Tens os documentos de que te falei de manhã?.

– Estão nessa pasta. 

Rafael abriu a pasta e pegou nos documentos. Leu-os, assinou-os, guardou os duplicados e afastou-se para o escritório sem dizer mais nada.

Irene, de pé, observou todos os movimentos do marido, em puro silêncio!... Estava admirada com a placidez de Rafael!... Esteve uns momentos indecisa, sem saber o que fazer!. Decidiu sair e comer algo num café.

Já a caminho, sem deixar de pensar na forma como as coisas estavam a decorrer, teve um pressentimento!... Voltou para trás e próximo de casa estacionou numa rua lateral. Esperava não sabia o quê!. Mas esperou!..

Rafael esperou que Irene saísse. Não se enganou quando pensou que ela se decidiria por ir comer fora. Logo que ouviu o carro a pôr-se em marcha saiu do escritório com um molho de chaves numa mão e um envelope na outra. Colocou ambos em cima da mesa da sala e saiu. Já na rua, voltou-se e olhou a casa por uns instantes. Cabisbaixo, entrou no carro e arrancou.

O pressentimento de Irene, estava certo. Logo que viu passar o velho BM, que tão bem conhecia, segui-o a alguma distância. Em marcha lenta, Rafael encaminhou-se para a saída da cidade. Irene não teve dificuldade em segui-lo. Passados dez minutos, Rafael entrou na estrada principal de acesso á Capital. Nem pelo retrovisor olhou para trás. Se o tivesse feito, a uma centena de metros, teria visto um mini branco a abrandar a marcha e parar, na berma.

Irene não acreditava no que estava acontecer!... - Vai embora, assim!... sem uma palavra!... Sem se despedir!... Que estranho!... – Disse para consigo.

Naquele momento, sentiu que a sua vida tinha dado uma reviravolta. E, de facto não se enganou. Só não imaginou o seu tamanho e o quanto lhe ia custar.

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Sexta-feira, 25 de Março de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 28)

28

 

Como estava para breve a publicação da colocação, de Irene, na Comarca, estava na altura de prepararem a mudança.

- Rafael. A publicação das colocações, está para breve!. Acho boa ideia, começarmos a preparar a mudança!. – Alertou Irene

- Quando quiseres!. Já pensastes em alguma coisa?.

- Alguma coisa, Como?

- A casa por exemplo: Pequena, grande, com jardim, sem jardim!. Essas coisas!. Nisso, vocês, costumam ser mais exigentes que nós!.

- Tens razão!....Não. Não pensei em nada!. Mas, acho que uma cidade daquelas, não será difícil alugar uma vivenda!. Quanto a tamanho, não é necessário que seja muito grande!. Somos só nós dois! O que é que achas?.

- Concordo, com a vivenda!. Apartamento não!. Nem sei se por lá os há!. Uma vivenda com garagem e jardim, será bom!. Sempre dá para me entreter!. – Alvitrou Rafael.

No fim de semana seguinte deslocaram-se a Moura à procura de casa. Tal como calcularam não foi difícil encontrar. Alugaram uma vivenda, nos arredores da cidade, de 1º e 2º andar, acabada de construir. Tinha seis assoalhadas, garagem e jardim em toda a volta. – Tal como Rafael desejava.

 Num outro fim de semana voltaram para tratar das mobílias. Mobilaram com o indispensável e ao gosto de Irene. Concordaram que, outros requintes viriam, à medida que necessitassem, quando estivessem estabelecidos definitivamente,!.. Como o tribunal ficava distante, antecipadamente e de surpresa, Rafael comprou um “mini” para Irene se deslocar. Ele continuou com o seu velho BMW.

O dia D, chegou numa Terça Feira. Na Segunda Feira seguinte, Irene tinha de se apresentar ao Juiz da Comarca onde tinha sido colocada. Não esperava que o espaço de tempo fosse tão apertado. Contava com, pelo menos, quinze dias. Tinha de se apressar.

Na Quarta Feira, falou com o Dr. Carlos de Almeida e começou a passar os processos que tinha em mão. Não eram muitos, e, só um é que era mais complicado. Os outros eram recentes, o que facilitou!. Na Quinta Feira, fez as despedidas e ficou liberta da Sociedade de Advogados.

 

~~~~

 

O fim de semana já o passaram na nova casa. Aproveitaram-no nos preparativos, naturais e normais, de quem faz uma mudança. Estava tudo a correr bem. Estavam ambos satisfeitos, cada um á sua maneira: Irene, estava a conseguir o que queria e Rafael estava a reviver a vida.

- Aqui, neste recanto do Alentejo, vai começar uma nova etapa na minha vida!. Só espero que tudo corra bem!. Pelo menos, como até aqui!. – Disse Irene, voltando-se para Rafael

- Vai correr!. … Pensando bem, também eu iniciei uma nova etapa!. …Começou, quando te conheci!. … Até aí, não pensava ser possível!. Ou, melhor, não tinha pensado nisso!

- Coisas da vida!. Ninguém pode fugir ao destino!. … Estás contente?

- Sim. Estou contente e feliz!. E tu?

- Eu também!. Encontrar-te foi bom!. Sentia-me só!. Agora, tenho-te a ti!. Também estou feliz! Espero que esta felicidade se mantenha por muitos e muitos anos! – Respondeu Irene.

- Ainda bem!. Que Deus nos ajude!. - Arrematou Rafael.

No fundo, Rafael, pressentia que o casamento não iria durar muito tempo. Ela era jovem e bonita e ele sabia, muito bem, a idade que tinha. Teria preferido viver junto com ela e quando acabasse, acabava. Ponto final. … Assim como assim, quando tivesse de se divorciar, divorciava-se. E ponto final também. Em qualquer dos casos para Rafael não havia muita diferença. Quando se confessou apaixonado, quer se casasse ou juntasse, assumiu sem reservas, ser ele a suportar todas as despesas. O que tinha, dava para os dois. Só ter companhia, já era bom. E de facto Irene, era a ideal!... Ele gostava!...

Os primeiros dois anos no Alentejo foram óptimos. Ao princípio, Irene estranhou. Já estava habituada a fazer as coisas à sua maneira e ali teve de refrear os ímpetos que por vezes a assaltavam. Ainda bem que o fez, porque não houve poucas situações, que viu não ter razão.

- A doutora tem de ter mais calma!. Não se esqueça, que não pode tomar decisões a quente!. Qualquer sentença, por mais simples que pareça, tem de ser reflectida!. – Aconselhava o Juiz responsável.

- Tem razão!.  Admito que por vezes me precipito!. Mas, também já estive pior!. Vou fazer os possíveis para me auto corrigir rapidamente!

No segundo semestre de funções, já tinha, incutidos, os parâmetros de sensibilidade adequados. Num ou noutro caso, o Juiz, ainda, corrigia. Coisas simples. Por vezes era só para não ficar calado. No segundo ano, Irene começou a brilhar e a ter muita popularidade. A sua dedicação, estava  a ter a devida compensação. Sentia-se cada vez melhor.

Para a sua dedicação plena, ao Tribunal, o contributo de Rafael foi determinante. Como não tinha compromissos, encarregava-se das lides da casa: Cozinhava, tratava da roupa, ia ás compras …. Fazia tudo. Irene não se preocupava com nada.

Terminado o período de Auditora, como era de esperar, o Juiz avaliador deu-lhe a pontuação máxima.

 

~~~~

 

Passada esta etapa era altura de pensar na seguinte: Concorrer como Juíza efectiva.

Não foi necessário pensar muito!. O juízo que a acompanhou, estava á beira de se aposentar e teve uma conversa com ela.

- Como sabe, em breve vou pedir a aposentação!. Com quarenta anos disto, acho que é mais que justa!. No entanto, os serviços, por vezes protelam, por falta de substituto!. – Disse o Juiz a Irene.

- Oh Dr.!. Eu já cá estou!. Se os serviços, aceitarem eu substituo-o!.

- Era isso que queria ouvir de si!. Não sabia se tinha outros projectos!. Normalmente todos querem ir para perto do poder!. É mais fácil progredir!

- Eu sei que sim!. Mas veja: Eu tenho a vida estabilizada nesta cidade, gosto de cá estar e não tenho “padrinhos”!. Creio que, sem experiência, não será fácil, ir “para perto do poder”, como diz, sem influências!. Até podia ter sorte!. … mas duvido!.

- Isso é verdade!. … Mas, com mais tempo e com provas dadas, acho que deve tentar!. Não faça como eu, que me acomodei!. – Confessou o Juiz.

- Sim. Não faço ideia de eternizar por aqui!. A seu tempo verei!. Mas, entretanto vou crescendo por cá!.

- Bem! Então posso avançar com a proposta, ou quer pensar?. Olhe, que é mais que certo que vai ser aceite!. Este buraco não é apetecível para ninguém.

- Avance!. – Concordou Irene.

Tal como o velho Juiz tinha dito, não era apetecível ir para o Alentejo, portanto, não havia candidatos ao lugar o que facilitou a aceitação da proposta, por parte dos Serviços Centrais. E, graças a esta coincidência continuou em Moura.

 

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Como Juíza efectiva o estatuto de Irene mudou radicalmente: Além de estabilidade profissional e mais responsabilidade o vencimento triplicou. O sonho de menina, relativo à abundância, estava a concretizar-se. Se, desde que casou com Rafael, nada lhe faltava, agora ainda menos.

Nos dois anos seguintes não houve alterações no relacionamento do casal. A própria Irene, por mais fria e calculista que fosse reconhecia que Rafael lhe era leal e a sua ajuda tinha sido preciosa para chegar até ali. No fundo até sentia algum remorso por o ter envolvido só, praticamente, por mero interesse!...

Já iam em quatro anos de casamento. Rafael não esperava que durasse tanto. Estava convencido que Irene casou com ele por amor ao contrário do que pensou na altura. O que no princípio não passava de uma atracção por Irene, transformou-se em amor verdadeiro. Também ele sentiu remorso por ter duvidado do sentimento dela.

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Sábado, 19 de Março de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 27)

 

27

 

A mudança para as novas funções, era boa em termos de carreira, mas prejudicial financeiramente.

A colocação na comarca como auditora tinha a duração mínima de dois anos. O ordenado base era muito baixo e a percentagem em custas numa comarca pequena não era grande. Irene tinha consciência que não ia ser fácil. Já estava habituada a um nível de vida razoável e isso preocupou-a momentaneamente. - Se, estivesse casada!. Com dois ordenados sempre seria diferente!. – Pensou.  Mas não estava e parece que ultimamente os homens fugiam dela!. Tão assediada que fui noutros tempos! – Lembrou. – O Jorge ainda me parece interessado e eu não tenho ligado nenhuma!. Na verdade não me impressiona muito! Ou melhor, não me impressiona, como me impressionou em tempos! Mas, também não me repugna ……  talvez …. Se eu ……….!. Não. Não posso. …… Com a situação dele, ainda piorava a minha!. – Pensou. Bem! Mas não é por isto que vou desistir!. Dois anos passam depressa!. – Disse para si própria. 

Entretanto, enquanto não saiu a colocação, foi encarregue pela Sociedade de organizar e acompanhar um processo de defesa de um viúvo,  numa acção relativa a partilhas, movida por uns sobrinhos. Rafael, assim se chamava o viúvo, na casa dos cinquenta, com 1,70 de altura, 70 kg de peso, enérgico, de porte atlético, cabelo grisalho e simpático era o que na gíria se diz um homem bem conservado e charmoso. Tinha posses, mais que suficientes para viver o resto da sua vida em tranquilidade e sem problemas financeiros. Mas, os sobrinhos queriam extorquir-lhe uma parte, alegando direitos por parte da esposa, falecida há cerca de um ano. A defesa foi bem arquitectada e a razão foi dada ao velhote. Rafael pagou os honorários à Sociedade e, reconhecido, gratificou Irene generosamente.

Na elaboração do processo, forçosamente, os dois, tiveram longas conversas. Pelo que Irene ficou a saber, quase, tudo sobre o velho. Disse-lhe que vivia de uma reforma, razoável, da Marinha Mercante e das rendas de um prédio de três andares, que tinha em Lisboa. Mas, não lhe disse que tinha dinheiro a render no Banco. Disse-lhe que viveu a maior parte da sua vida em Lisboa. Mas não lhe disse as suas origens. Só revelou o essencial para a preparação do processo e omitiu o que foi possível. Rafael, embora não aparentasse, era esperto e desconfiado. Por vezes, estas conversas de cariz profissional encadeavam-se noutras que não tinham nada a ver com o que estavam a tratar. Com alguma moderação e cuidado, falaram deles próprios, das suas vidas passadas, do presente e até de projectos para o futuro. Quanto ao futuro, quem mais tinha a dizer era Irene. Não escondeu que estava à espera de colocação numa Comarca e seguir a carreira da Magistratura. Para ele o futuro, era manter o que tinha e viver a vida o melhor que pudesse. Sem darem por isso, engraçaram um com o outro e criaram empatia. Rafael gostou tanto que fomentou contactos com alguma frequência: Almoços, jantares, passeios, visitas simples e grandes conversas. Ao princípio, Irene torceu o nariz. Pensava que o velho queria outra coisa!... Mas, Rafael era um cavalheiro e tratou-a sempre com respeito. ... Para seu espanto, quem começou a ter outras ideias, foi ela. – O homem até tem pinta: É simpático, tem charme ……. !. Não envergonha ninguém!. ... Tem  mais 30 anos que eu!. … Casar? … Será que ele pensa nisso? … Nunca abordou o assunto!. … Se ele quisesse! … Acho que não me importava! … Até resolvia o problema financeiro!. … Não custa nada tentar! …Amar!? … Amor!?. … De que me serviu isso?. … Gosto dele!? …Na verdade até gosto!. …  Nem é tarde nem é cedo!. … Vou tentá-lo!  – Decidiu Irene

Fria e calculista como era rapidamente magicou a estratégia a seguir…

Tornou mais intenso o relacionamento com o velhote. As simples visitas passaram a ser noites em conjunto e………. por aí fora!... …… A superação da barreira da intimidade deu lugar  a uma deliciosa familiaridade.

Como esperava o bom do Rafael, ao fim de algum tempo, confessou-se apaixonado. Irene, abriu a boca de espanto e fingindo surpresa disse-lhe que se sentia muito lisonjeada, mas que precisava de tempo para pensar!... O homem clarificou ainda.

– Não é preciso casarmos!. Se quiseres podemos só viver juntos!...

– Sim, mas mesmo assim tenho que reflectir e amadurecer a ideia!.

– Está bem! Quando decidires, diz-me!. – Arrematou Rafael.

O objectivo de Irene tinha sido atingido. Agora era só concretizá-lo!.. Para beneficiar em pleno do poder económico de Rafael, necessitava de o introduzir na sua vida. Isso só seria possível por via do casamento o que para Irene não era problema.

Propositadamente esperou que fosse Rafael a voltar ao assunto. O que aconteceu ao fim de, mais ou menos, 15 dias. Irene estava preparada e respondeu:

- Rafael! Eu gosto muito de ti!... Mas é bom que saibas que eu não vou desistir da minha carreira por causa de uma relação que possa assumir contigo!... Dentro em breve vou para o Alentejo, onde estarei pelo menos dois anos e não estou na disposição de ir numa situação familiar comprometedora!. Uma futura Juíza, que é o que pretendo ser, tem de dar o exemplo. Assim, deves entender que só te direi o “sim” se me quiseres acompanhar como marido!... Se não quiseres!.. Continuamos amigos!...  – Concluiu.

O velho não ficou muito surpreendido e respondeu:

- Está bem!. Reorganizar a vida aqui ou no Alentejo é-me indiferente!... E, como vão os teus pais reagir?. Pensaste nisso?.

- Pensei!. Pensei muito!. Quando souberem, vai cair o Carmo e a Trindade!. Mas, depois passa-lhes, espero eu!. Se não passar, paciência! A vida é minha!.

E de facto não se enganou. Os pais de Irene quando souberam, nem queriam acreditar. O pai veio de propósito a Lisboa, tentar dissuadi-la. Não conseguiu. Voltou a Vale do Seixo, envolvido, numa tristeza enorme. – Um genro da minha idade! – Pensava.

Indiferentes a tudo e a todos e sem cerimónias, resolveram casar e casaram em regime de comunhão de adquiridos. Decidiram viver na casa de Rafael.

 

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Quarta-feira, 9 de Março de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 26)

26

 

Com cédula e credenciais é que a carreira, profissional, de Irene ia começar e desenvolver-se a sério. A Sociedade de Advogados onde estagiou propôs-lhe continuar com outro estatuto, obviamente. Celebraram um contrato. Irene, embora esperasse mais generosidade em termos de remuneração, aceitou as condições sem pestanejar, tendo em atenção o quanto podia aprender com aqueles advogados experientes. - Mais tarde, já com outro estofo renegoceio! – Disse a si própria.

Começou com um caso simples: Uma desavença entre sócios de uma sociedade comercial. O constituinte que Irene ia defender, queixava-se que o sócio desrespeitava os estatutos da sociedade, fazendo negócios paralelos. O outro sócio, negava, argumentando que quem fazia esses negócios, era a esposa e não ele.

Irene organizou o processo: Ouviu o cliente, reuniu as provas e como não conseguiu acordo extrajudicial, entrou com a acção em tribunal. O Dr. Carlos de Almeida viu o processo e discutiu com Irene a argumentação a utilizar na audiência!. Não havia muito a dizer!. As provas conseguidas eram mais que concludentes.

- Não vai ter problemas!. A acção está ganha!. Não se deixe impressionar pelo colega oposto!. É evidente que ele vai argumentar de toda a maneira e feitio! Mesmo que se aperceba de algo tendencioso, não reaja!. O Juiz também se apercebe dessas espertezas!. – Recomendou-lhe 

Chegado o dia, Irene pegou no processo e encaminhou-se para o tribunal. Chegou meia hora antes da hora marcada. Falou com o constituinte e cumprimentou o outro advogado. Este ficou aliviado ao vê-la. Pensava que iria encontrar o Dr. Carlos de Almeida!. – Isto facilita as coisas!. Com a novata, talvez consiga dar a volta! – Disse para si próprio.

O Oficial de Diligência, à entrada da sala de audiência, fez a chamada. Não faltava ninguém. Ocuparam os seus lugares e esperaram a entrada do Juiz. Para Irene esta espera, estava a ser aflitiva. Toda ela tremia por dentro. Era a primeira vez que vestia a toga e assumia a responsabilidade de defender alguém. Como era diferente de quando estava, ao lado, do patrono!. O Oficial de Diligência, anunciou a entrada do Juiz e todos se levantaram. O Juiz, cumprimentou com um “bom dia”, mandou sentar e declarou aberta a audiência.

O Oficial de Diligência leu a acusação e deu a palavra ao advogado do réu. O advogado levantou-se e deu inicio à defesa.

- O meu constituinte é acusado de desrespeitar os estatutos da empresa em que é sócio com o litigante!. Pois bem! Isso é uma falsa acusação!. Na verdade todos os negócios, que de certa forma colidiriam com os da sociedade, foram efectuados pela esposa. Uma cidadã com idoneidade para praticar todo e qualquer acto de comercio!. As intervenções, que admite ter tido, foram na qualidade de conselheiro!. O tribunal, não pode ignorar e ficar alheio, ao facto do meu constituinte ser, indirectamente, responsável pelos negócios da esposa, uma vez que estão casados em regime de comunhão de bens!. Por este facto será natural que ….. ……………………………………………….!. Termino! Peço a absolvição do réu, com base nos factos que apresentei!. O réu e testemunha, estão à disposição do Sr. Dr. Juiz e do Sr. Advogado de acusação para interrogatório.

Chegou a vez de Irene. Ouviu, atenta a defesa e curiosamente foi ficando mais calma. Quando se levantou para apresentar os factos que justificavam a acusação, já não tremia. Lembrou-se das brilhantes intervenções que fez na faculdade e ali, pelo menos, em termos de postura, não era diferente!. Cheia de confiança e com o ego em cima, entrou a fundo na questão.

- O artigo 10º dos estatutos da sociedade, em que o meu constituinte é sócio, é bastante claro quanto a actos e/ou actividades – sublinho, “actos e/ou actividades” – dos sócios que directa ou indirectamente possam concorrer com o objecto social da sociedade!.

- Pode ler, à audiência, o artigo que referiu? – Pediu o Juiz.

- Sim senhor. “Qualquer sócio ou funcionário da sociedade, não poderá praticar actos e/ou actividades que directa ou indirectamente possam concorrer com o objecto social da sociedade. A verificar-se tal situação, a empresa adquire o direito de pedido de indemnização pelos prejuízos causados”

- Registar e juntar o artigo aos autos!. – Disse o Juiz, dirigindo-se ao Oficial de Diligências. Voltou-se para Irene e mandou-a continuar.

O outro advogado, mexeu-se na cadeira, acusando o mal estar que lhe causou a ordem do Juiz.

- A defesa alega que a intervenção nos negócios foi de mero conselheiro!. Pois bem!. Ser conselheiro é praticar uma actividade e, segundo o dicionário da língua portuguesa, praticar uma actividade é fazer “algo”- Sublinho “algo”!. “Algo”, no caso em julgamento, foi influenciar negócios!. Negócios, estes, que segundo as provas juntas aos autos, provam ser concorrentes com os da sociedade!. Além disto as provas mostram claramente que …………………………………………..! Termino. Peço que o réu seja condenado a pagar uma indemnização, a calcular, em função dos negócios feitos e provados. O litigante está à disposição do Sr. Dr. Juiz e do Sr. Advogado de defesa para interrogatório.

A intervenção de Irene, só não foi brilhante, porque não tinha conteúdo para brilhar. Mas, que foi boa, foi.

Nem o Juiz nem os Advogados interrogaram os intervenientes no julgamento. O Juiz deu, ainda, a hipótese ao advogado de defesa de contra argumentar. Não adiantou nada. Assentou na mesma base e acabou por se repetir!...

- Alguém tem algo mais a dizer? – Perguntou o Juiz olhando para a audiência.

Ninguém se manifestou.

-  Declaro interrompida a audiência, que continuará daqui a meia hora, para proferir a sentença. – Disse o Juiz, ao mesmo tempo que dava a tradicional “martelada”.

Passada meia hora foi conhecida a sentença. Como era de esperar o réu foi condenado a indemnizar a sociedade. Irene ganhou a sua primeira acção!.

 

~~~~

 

A dedicação de Irene aos processos era doentia. Ia tão fundo, que o próprio patrão ao analisar um processo lhe disse:

- Não é preciso tanto preciosismo!.

- Os processo não podem ter falhas!. Lembra-se de mo dizer? – Respondeu Irene.

O advogado, abanou a cabeça e sorriu sem dizer nada.

Irene continuou a proceder da mesma maneira e não se arrependeu. Foi-lhe muito útil em processos que ao principio pareciam simples e depois se complicavam e permitia-lhe ajuizar com rigor sobre o desfecho dos mesmos. Não foram poucas as vezes que emitiu opinião de que a avançar era uma acção perdida, embora a decisão e o aviso ao cliente, fosse da responsabilidade do Dr. Carlos de Almeida.

O ano para a Sociedade de Advogados foi bom. Irene teve bastante trabalho. À medida que ganhava experiência era encarregue de acções de maior dimensão. No entanto, a sua dedicação era igual em todas. Honra lhe seja feita!. Só ganhou com isso!. Com umas mais fáceis e outras mais complexas, passou-se um ano.

Irene sentia-se segura e estava a preparar-se e arranjar coragem para renegociar o contrato. Não foi necessário. Sem esperar, o patrão chamou-a e fez-lhe nova proposta.

- Sabe, porque é que a chamei?. – Começou o Dr. Carlos de Almeida.

- Não. Provavelmente para me encomendar mais uma acção que tenha em mão!.

- Também é isso!. Mas não só!. Como seu patrono, fui encarregue pelos meus sócios de lhe manifestar o apreço da sociedade pelo seu, magnifico, trabalho!. O seu nome, já começa a ser soado no meio!... Não tarda, começa a ser cobiçada pela concorrência!... Não sei, se de momento, tem algum projecto, em vista, para o futuro!... Ou se já pensou nisso!?... Quero, no entanto, pedir-lhe pessoalmente, que não tome nenhuma decisão sem falar primeiro comigo!...

- Nem era preciso pedir-me!... Qualquer assunto ou decisão profissional, não interessa o tipo, o Dr. será o primeiro a saber!... Aliás, até tenho um assunto para falar consigo!... Confesso que, ainda, não o fiz, por falta de coragem!...

- Calculo que tenha a ver com o seu contrato!. Objectivamente a remuneração!

- É! – Admitiu Irene.

- Pois!. Isso era o outro assunto que tinha para falar!... A proposta que lhe vou fazer foi aprovada por todos os sócios!. – Revelou o advogado e continuou – Propomos o vencimento base de …… acrescido de um prémio de 5% sobre os honorários cobrados nas acções ganhas!. Concorda?

Desta vez foram generosos. Irene ficou satisfeita com o que lhe propuseram!. Para principiante era uma óptima oferta.

- Concordo!. Agradeço a atenção!. Para principiante acho bem!. – respondeu Irene com sinceridade.

- Óptimo!. Depois assinamos a adenda!. … E, quanto ao futuro?. Pensa fazer carreira nesta área, ou tentar outra?. – Quis saber o patrão.

- Dr.! Vou ser sincera na resposta!... Embora esteja a gostar da advocacia, também me fascina a Magistratura!... Tenho andado a pensar em concorrer ao CEJ!. … Quando?... Quando abrirem vagas!, E, isso ninguém sabe!... – Informou Irene.

- Quer acredite ou não, eu já tinha pensado nisso!... Acho que você tem perfil!... E, em abono da verdade é uma bonita carreira!... Em minha opinião, acho que faz bem!... Advirto-a, no entanto, que não vai ser fácil!. Além da dificuldade das provas, vai concorrer com gente muito influente!. É uma carreira muito selectiva!... Percebe o que lhe quero dizer?... Não entenda as minhas palavras como dissuasoras!.

- Não. Não vejo as suas palavras como tal!. Acho que entendo o que me quer dizer e até lhe agradeço a confirmação do que já suspeitava!. Sei que não vai ser pêra doce!. É um desafio que vou tentar vencer!. Se não conseguir, paciência!.

- Desejo-lhe boa sorte, quando chegar a altura!. Se puder ser-lhe útil, conte comigo!. Terei muito gosto em ajudar, se puder!

- Obrigado, Dr.! Conto consigo! – Agradeceu Irene.

 

~~~~

 

Irene saiu do gabinete, do patrão, satisfeita com a proposta de remuneração e com a conversa relativa ao futuro. Estava tudo a correr bem!. A motivação era tal que não pensava em mais nada. Nem nas férias que se aproximavam.

Com esta promissora estabilização profissional, estava na altura de pensar na sua vida privada. Quanto a namorados e projecto de vida familiar, não estava preocupada. Mas, ainda estava em casa dos tios. Embora, participasse nas despesas e os tios não lhe levantassem problemas, sentia que já estava a abusar. Era o sexto ano em casa deles. Estava na altura de tomar outro rumo.

Pegou no jornal e procurou casa. Não foi difícil. Alugou um apartamento com três assoalhadas na zona das Amoreiras. Não precisava de tanto, mas lembrou-se que, tudo a correr bem, o irmão terminaria o curso dali a um ano e poderia, eventualmente, pensar em vir para Lisboa. O tio Teófilo e tia Gracinda, compreenderam-na, mas sentiram a sua saída. Estavam muito habituados à sua presença e sentiam-se, de certa forma, protegidos. As suas idades já eram avançadas.

Também, Irene se sentiu com a mudança. Até ali só se preocupava com o almoço, com as suas coisas pessoais e com o quarto. Agora era totalmente diferente. Tinha de se preocupar com tudo. Também sentiu a despesa: Renda, água, luz, gás e alimentação eram de sua conta e responsabilidade. – É muito para uma pessoa sozinha! Pode ser que o Rui venha!. – Pensava com frequência. A decisão estava tomada, teve de aguentar. Não passava mal, mas gostaria que desse para mais!... O bichinho da “ambição” mexia lá dentro.

 

~~~~

 

No final do ano lectivo 1974/1975, o Rui terminou o curso, mas ao contrário do que Irene esperava e apesar da sua insistência, ficou por Coimbra. Além de já estar habituado à cidade, bastante mais calma que Lisboa, conseguiu trabalho numa pequena empresa. Não oferecia grande futuro, mas para começar, servia. Ou melhor, por agora, servia!. Já que, o que na verdade pesou na sua decisão, foi o facto de já ter namorada e não querer deixá-la sozinha.

- Talvez mais tarde, quando a Beatriz terminar!. – Decidiu Rui.

Perante isto, Irene equacionou mudar de casa. Arranjar uma mais barata. Enquanto equacionava e media os prós e os contras, a sociedade reviu-lhe, novamente, o vencimento. Mais uma vez foram generosos. Ficou melhor. Mas mesmo assim, se arranjasse uma casa de duas assoalhadas, os custos seriam menores. Sozinha numa casa daquelas, era desperdício. – Logo se vê! – Disse para si própria

Entretanto, chegaram novidades que iam alterar mais uma vez a sua vida. Em Janeiro iam abrir vagas para Juízes. Logo que fossem publicadas no Diário do Governo, o CEJ - Centro de Estudos Jurídicos abriria o concurso. As provas, em três fases, realizar-se-iam em Março e Abril. Era o que Irene esperava. A altura era boa. Os dois anos e meio de experiência em advocacia, eram uma mais valia. Falou logo com o Dr. Carlos de Almeida.

- Dr. Já sabe a novidade? – Perguntou Irene com expressa alegria.

- Novidade!. Que novidade?

- Vagas para Juízes!  

- Ah! …Já! … Já me soou qualquer coisa! … Isso quer dizer que, pelo menos, uma candidata já há!.

- Ah! Pois! . Eu sou de ideias fixas!

- Faz bem!. … Tem é de se preparar muito bem!. Olhe que aquilo vão ser 100 cães a um osso!

- Vou fazer o melhor que puder!.

- Bem! Nós, sociedade, vamos ajudar no que pudermos!. … Para já, conte com o mês de Fevereiro para se preparar!. … Ainda vamos falar mais nisso, mas por enquanto retenha esta informação para si!. – Informou o patrão.

- Oh! Nem sei como agradecer!. Muito obrigado! 

- Não é para agradecer!. È preciso, é que se safe! – Respondeu o patrão a rir.

- Obrigado! . Mais uma vez , obrigado! – Repetiu Irene.

A partir deste momento, o concurso passou a ser uma preocupação permanente na cabeça dela. A preparação para as provas começou neste momento.

Até lá continuou com os processos, audiências e julgamentos. Ia ao tribunal duas e três vezes por semana. Com tantas idas, admirava-se de, ainda, não ter encontrado nenhum colega de curso. Admitia que a causa fossem os horários. Um dia à saída de uma audiência, quando menos esperava, deparou com Jorge, no corredor.

- Olá! Tu por aqui? – Cumprimentou-o

- Sim!. Ia a passar, vi-te lá dentro e esperei que saísses!.

- Estás aqui casualmente ou em serviço?

- Estou em serviço!. Desde Há um mês, venho cá algumas vezes!. Desde o estágio que estava apeado!.... Entretanto o meu patrono, sabendo disso, convidou-me a trabalhar com ele!. … Basicamente tenho organizado processos, lá no escritório!... Mas, agora em coisas simples, quando não lhe apetece vir, manda-me a mim!. Não é que me agrade a situação, mas não tenho mais nada!. – Lamentou-se Jorge.

- Pois! … Isto não está fácil!. … E, dos outros, sabes alguma coisa? – Quis saber Irene.

- Do grupo, só eu e tu estamos em Lisboa. O Tiago e a Clara, casaram e foram viver para  o Porto!. … A Clara é notária e o Tiago, penso que trabalha numa empresa, como Jurista!. … Do resto da malta! … Vejo por aí um ou outro!. … É isto! – Informou Jorge.

- É natural que assim seja! . Cada um vai para seu lado e o resultado é esse!.

- E tu? Estás satisfeita? – Questionou Jorge.

- Não me posso queixar!. Tenho tido bastante trabalho!. Ganho algum!. Enfim, faço a minha vida.

A conversar, encaminharam-se para saída do tribunal. Jorge, esteve tentado, mais uma vez, a pressionar Irene, mas desistiu. Despediram-se. Dali em diante, voltaram a ver-se com alguma frequência.

 

~~~~

 

Até Março, o tempo voou. O mês de Fevereiro, tal com lhe tinha sido prometido, foi de preparação. Foi dispensada de processos, audiências e de tudo o resto. Estudou o mais que pode. Finalmente o dia da primeira fase chegou. Correu bem!. Passou à segunda. Voltou a correr bem!. Passou à terceira. Foi aprovada!.  Quando soube o resultado, nem queria acreditar. Tinha entrado na Magistratura!. Tinha entrado no reino dos Juízes!. Tinha entrado no reino dos Supremos!. Estava feliz.

Todos os advogados da sociedade lhe deram os parabéns. Também, para eles era congratulante que uma futura Juiz tenha passado pela sociedade.

- Não me surpreende o ter passado!. O que me surpreende é a facilidade com que passou!. Você é mesmo boa!. Disse-lhe que tem perfil, e não me enganei!. Acredito que vai fazer uma brilhante carreira! – Confessou, emocionado o Dr. Carlos de Almeida.

- Ai! Dr. Que me deixa sem fala!. Acho que não fiz mais que a minha obrigação!. Estudei e tive sorte!. É isso!. – Respondeu, modestamente, Irene.

- Pense como quiser! A modéstia fica-lhe bem!. Quando nos deixar não se esqueça que aquelas portas estão sempre abertas para si! Se precisar de nós, disponha!

- Não tenho palavras!. Tudo o que sei, devo-o a esta casa!. Juro que não me vou esquecer!. E, de si Dr. Também não!. O Sr. foi extraordinário!. Sinto orgulho de o ter tido como patrono!.

- Só mais uma coisa!. O passo seguinte é concorrer a uma Comarca. Garanto-lhe que aí é que vão contar as influências!. E, isso você não consegue controlar!. Aconselho-a a concorrer às da província que são menos concorridas!. Depois com o tempo logo vê!. Assim a hipótese de colocação rápida é maior!

- Não tinha pensado nisso!. Ainda bem que me alertou!. Vou seguir o seu conselho!.

Como de costume, Irene não perdeu tempo. Logo que teve oportunidade concorreu, como auditora, às três opções permitidas: Moura, Condeixa e Bragança.  Foi colocada, passados cinco meses, na primeira. Moura, no Alentejo.

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Quinta-feira, 3 de Março de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 25)

25

 

Já em Lisboa, Irene não perdeu tempo. No dia seguinte, munida do oficio convite, deslocou-se à Sociedade de Advogados. As instalações eram num 7º andar da Avenida Fontes Pereira de Melo. Pela primeira vez ia-se defrontar com o mundo do trabalho.

Na recepção apresentou o oficio. A recepcionista deu uma olhada e, simpaticamente, informou:

- O Doutor neste momento está com um cliente!. É capaz de demorar algum tempo!. Se quiser esperar!...

- E, acha que ele me recebe?. – Perguntou Irene.

- Sim. A não ser que tenha algo urgente!. Mas, se tiver não sai sem marcar consigo outra hora!. – Respondeu a recepcionista.

- Então, eu espero!. – Disse Irene

Irene sentou-se e folheou uma revista. Estava nervosa. Não conseguia concentrar-se na leitura. Passados cerca de quarenta e cinco minutos, saiu um senhor lá de dentro. O senhor saiu e a recepcionista entrou com o oficio na mão. Irene apercebeu-se e mais nervosa ficou. Passado pouco tempo a recepcionista voltou.

- Doutora. Faz favor! – Chamou

- Eu? – Respondeu Irene surpreendida. Foi a primeira vez que a trataram assim. Ainda não estava habituada ao DR.

- Sim. O Doutor vai falar consigo!. Faz favor de entrar!. – Convidou a recepcionista, com cortesia, ao mesmo tempo que a encaminhava para o gabinete do Dr. Carlos de Almeida. Um homem, grisalho, a rondar os cinquenta anos e com muita experiência em advocacia.

- Faz favor de se sentar!. – Convidou logo que se apresentou.

Irene, que entretanto acalmou, obedeceu e agradeceu. Em poucos minutos o advogado apresentou a empresa, os objectivos e entrou directamente no assunto.

- É politica desta sociedade proporcionar estágio a finalistas de direito que mais se distinguiram no curso!. Isto é, com as melhores notas!. A Doutora foi a melhor do curso!... Este ano abrimos uma vaga!... Se for do seu interesse, teremos muito gosto que estagie connosco!. – Disse o Dr. Carlos de Almeida.

- Sim. É do meu interesse!. Ainda não tinha procurado patrono, portanto só tenho de agradecer o convite e dizer que sim!. – Respondeu Irene.

- Está bem!. Congratulo-me com a sua decisão!. Eu vou ser o responsável pelo estágio. Espero que nos venhamos a dar bem!. – Concluiu o advogado.

Acertaram os pormenores e combinaram iniciar no dia 1 de Setembro. Assim, com esta facilidade e no dia 1 de Setembro do ano de 1973, Irene entrava no mundo do trabalho. 

 

~~~~

 

A duração, prevista, do estágio era de seis a dez meses, consoante o exame na Ordem se realizasse em Março, Abril ou Maio. Habitualmente decorria num destes meses.

Na primeira semana de estágio, Irene não fez outra coisa senão ver processos: Estrutura, abordagem, argumentação, alterações e respectivas conclusões. Interessada e estudiosa como era, absorveu o mais que pode e tomou as notas que achou por bem. Quando tinha dúvidas, perguntava e, solicitamente, o advogado esclarecia-a. O patrono não se intrometeu. Deixou-a à vontade. Na Sexta Feira fizeram o ponto de situação.

- Então!. Como é que se sente, depois desta estopada? Disseram-me que Já  esteve para desistir? É verdade? – Começou o Dr. Carlos de Almeida, a brincar mas com ar sério.

- Desistir? Eu?. Não!. Não comentei com ninguém o que estou a fazer e nem sequer tal me passou pela cabeça! Como pôde alguém dizer-lhe isso!? – Respondeu Irene alarmada não se apercebendo que o patrono estava a brincar.

- Ninguém me disse nada disso!. Estou a brincar!. Além disso as questões que me pôs indiciavam tudo, menos vontade de desistir! – Sossegou-a o advogado com um sorriso simpático.

- Ah! Assim já estou mais descansada!... Quanto à estopada, como disse; não acho que tenha sido estopada!. Verifiquei que a estrutura, abordagem e respectivas conclusões, seguem o mesmo método que, na faculdade, praticamos nas simulações!. A argumentação e alterações no processo, logicamente, variam de processo para processo!. Acho que não tive dificuldade em entender isso!.

- Isso é bom!. Porque é nessa base que o seu trabalho, ou melhor, o nosso trabalho se desenvolve!... Mas, atenção!... TUDO!. Repito, TUDO o que é colocado no processo, até uma simples virgula, não é para encher ou embelezar. Tem de ser posto com convicção e com objectivo definido. Qualquer processo, por mais simples que seja tem de ser construído, na perspectiva de que não pode ter falhas!. Na faculdade os erros ou falhas repercutem-se nas notas; aqui repercutem-se em julgamentos de pessoas!... Na faculdade um erro pode originar menos um valor ou dois e perfeitamente recuperável; aqui um erro pode originar a destruição de uma vida definitivamente!... – Aconselhou o advogado.

- Mas, Doutor!... Os advogados, também são humanos!. E, filosoficamente falando, todos os humanos podem falhar!. – Contrapôs Irene.

- Tem toda a razão!... Mas, aqui, repito, não pode haver falhas!... Se não conseguirmos provas fidedignas que fundamentem algo que estamos a seguir, para não falharmos, só temos um caminho a seguir, desistir por falta de provas!. Tudo isto pode constar no processo, mas não pode produzir efeitos judiciais!. – Percebeu?

- Sim. Percebi!... Não vou esquecer! – Concordou Irene.

Teceram mais algumas considerações sobre os processos e falaram sobre possíveis acções futuras.

Até finais de Outubro, além de seguir, de perto, processos em curso, assistiu a audiência, conjuntamente com o patrono, na qualidade de assistente. Em média havia duas audiências por semana. Era óptimo. Estava em contacto com a realidade. Mentalmente, quando os advogados argumentavam em defesa dos seus constituintes, fazia o seu juízo!. Só uma vez não acertou com a sentença. Isto guardou para si!. Não o manifestou ao patrono!.

A partir de Novembro até ao final do estágio, elaborou processos de raiz: ouviu constituintes, juntou provas, delineou estratégias e argumentações. Nas audiências quem brilhava era o patrono!. Este estava maravilhado com Irene. Reconheceu-lhe capacidade e competência. À medida que criava confiança nela, mais oportunidades lhe dava. Ela não recusava nada e dedicava-se com afinco. Ganhava capacidade e competência dia a dia. Sentia-se bem e não pensava em mais nada.

No inicio de Abril realizou-se o exame na Ordem. Enquanto esperava a chamada para a prova, encontrou-se com alguns colegas de curso, nomeadamente Tiago e Jorge. Não os voltara a ver.

- Olá Irene!. – Cumprimentaram.

- Olá!. Também vêm fazer exame? – Respondeu Irene.

- Vimos!.

- A Clara não veio? – Perguntou a Tiago.

- Não. A Clara decidiu concorrer a notária e está a preparar-se!. Parece-me que as provas são para o mês que vem!

- Fico contente por saber!. Deus queira que tudo lhe corra bem!. Dá-lhe um beijinho!.

- E tu, estás a estagiar ou vens fazer exame por tua conta!. Perguntou Jorge aproveitando o momento em que Tiago se afastou para cumprimentar outro colega.

- Bem!. O exame é sempre por conta de quem o faz!. Mas, sim. Estou a estagiar se é isso que queres saber! – Respondeu friamente Irene.

- Oh! Irene. Porque me tratas assim?... Se tu quisesses ……. Podíamos ……

- Eih! Para. Não quero ouvir mais nada!. Não quero, nem posso!. Está tudo bem assim como está! – Interrompeu-o Irene com aspereza, antevendo as intenções de Jorge.

- Ok!. Ok!. Desculpa!. Não te quis ofender!. – Respondeu Jorge com humildade.

Irene, arrependeu-se de responder como respondeu, mas não o demonstrou.

- Não devia ter respondido assim!... Já está!... Já está!... Não posso voltar atrás! – Pensou para consigo.

Jorge já não disse mais nada. Ficou triste!. Entretanto chegou Tiago ao mesmo tempo que a chamada ia começar. Despediram-se com antecipação: Tiago com um beijinho, Jorge com um simples aceno!.

A prova correu bem a Irene. Os resultados só eram conhecidos dali a um mês, mais ou menos!..................... Como era de esperar ficou aprovada com distinção. Na semana seguinte inscreveu-se na Ordem dos Advogados. A partir daqui podia assumir-se nas audiências.

A primeira parte da carreira profissional de Irene, estava feita.

publicado por jcm-pq às 16:57
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Sábado, 19 de Fevereiro de 2011

Das Berças aos Top´s da Magistratura (capítulo 24)

24

 

No dia seguinte, como estava previsto, Irene partiu para Vale do Seixo. Nas seis horas de viagem, aprofundou a reflexão que vinha fazendo há algum tempo. O episódio, desagradável, que se passou com os colegas de grupo neste segundo semestre, relativo às notas, fê-la pensar. Passou em mente todo o seu passado e de consciência sabia que tudo o que conseguiu foi à sua custa. Não atropelou nem prejudicou ninguém, antes pelo contrário, até ajudou!. No entanto, nesta altura da vida, para além dos familiares próximos, só confiava em duas pessoas: Leonor e Inês.

- Inês!... Há tanto tempo que não sei nada dela!.. – Pensou Irene.

Chegou a pensar que o seu crescimento, talvez, tenha sido anormal!.. – Não!. Não foi anormal! … - Concluiu. – Então, porquê isto? – Questionou para si própria. Meditou mais um pouco e obteve a resposta: O seu crescimento, maturidade e personalização assentou numa simbiose invulgar: Ambição e honestidade. O curso, os colegas, o ambiente Lisboeta e sobretudo os bofetões da vida fizeram o resto. E, de facto aos 24 anos, Irene era uma mulher com características próprias: Fisicamente era muito bonita e atraente; era inteligente, esperta e trabalhadora – tanto que conseguiu tudo o que queria; foi lutadora e fria – Não olhou a meios para atingir os fins, desde que os meios não prejudicassem quem quer que fosse; foi perspicaz, interesseira e calculista –  viu-se que foi a melhor em todas as cadeiras.

Tranquila e convicta de que estava no caminho certo, mentalmente pensou que no futuro iria proceder, exactamente, da mesma maneira.

 

~~~~

 

A chegada estava próxima. Ficou de repente ansiosa. Embora os pais já soubessem que tinha terminado em beleza, queria abraçá-los e festejar com eles. Queria sentir a mesma alegria que sentiu com o Tio Teófilo e tia Gracinda.

Os pais de Irene estavam contentíssimos. E, de facto não era para menos!... O Rui já tinha regressado de Coimbra, estava junto deles e também, ele, ia no bom caminho. Tinha passado para o 4º ano de Economia. A breve chegada de Irene, já licenciada, ia completar o quadro familiar.

À espera dela estavam o pai e o irmão. Abraçaram-se os três com alegria e apressaram-se a regressar a casa.

- A tua mãe disse logo para não nos demorarmos em conversas!... – Disse o pai

- Oh! E encarregou-me de não vos deixar sequer, começá-las!. – Olha, que se eles começam, nunca mais param! – Disse o Rui imitando a mãe.

- Então, não a vamos fazer esperar!. É natural a sua ansiedade!. Até eu estou ansiosa de a abraçar com quanto força tenho!. – Concordou Irene.

Em casa a mãe estava em pulgas!.

- Mas, porque é que eu não fui também?. Espero que o comboio não venha atrasado! – Pensava.

Não esperou muito. O comboio chegou dentro do horário e as suas recomendações foram cumpridas. Logo que sentiu a porta a abrir correu ao encontro da filha.

- Finalmente, Filha!. Estava a ver que nunca mais chegavas!.

- Ah! É!. Mas olhe que não venho nada atrasada: Fiz ontem a oral e hoje já aqui estou!. Olhe, que nem o comboio atrasou!. Até esse foi nosso amigo! – Respondeu Irene a rir.

- Eu sei!. Filha!. É um modo de dizer!. – Justificou-se

- Oih!. Nem sabes o que eu aturei desde ontem!. Logo que soube que a filha era Doutora, ficou assim!... Parece-me que esta noite, até sonhou com isso!. – Disse o pai.

- É doido!. Não acredites em nada do que ele disse!...

- Ah! Agora disfarças!.

- Ah! É?. Então, quem é que choramingou com a notícia?. Fui eu ou foste tu?

- Bom! Vamos lá, mas é, almoçar, senão o comer arrefece!. – Disse o pai cortando o diálogo.

- Ah! A conversa já não te agrada?. Cobardolas!... – Disse a mãe, ao mesmo tempo que se voltava para a filha e continuava -  Ontem quando soube que tinhas acabado, ficou tão emocionado que até chorou!... E, agora está armado em valente!.

A rir e com boa disposição, própria do momento, encaminharam-se para a mesa onde continuaram a conversar alegremente.

Durante a tarde, mãe e filha, puseram a conversa em dia ao mesmo tempo que  prepararam um pequeno festejo.

À tarde, estava tudo preparado. Foi uma festa simples. Convidaram os vizinhos com quem mais se relacionavam, a Maria o marido e filha. Leonor não estava em Vale do Seixo e Irene teve pena. Foi agradável. Irene gostou. Gostou, sobretudo, da alegria manifestada sem qualquer indício de inveja!

Em Vale do Seixo, como de costume, a notícia correu depressa quando algo de diferente acontecia.

- Olha, a filha dos professores, já é doutora de leis!... Parece que se diz, advogada!. – Dizia a vizinha Maria da Luz.

- Ah! Sim!. Então, e agora o que é que vai fazer cá na terra?... O que é que faz uma Advogada? – Respondeu uma outra vizinha, com ignorância.

- Ah! Isso não é para ficar por cá!. Deve voltar para Lisboa!. Não vês. A Leonor! A filha da Francisca, também ficou lá por Castelo Branco!. – Esclareceu  Maria da Luz.

Durante alguns dias as conversas relativas a Irene, eram mais ou menos assim. Houve pessoas que foram, propositadamente, a casa dar-lhe os parabéns. A simplicidade desta gente era tão grande que sensibilizou Irene. Afinal, Irene tinha características muito próprias, mas também era sensível como todos os humanos.

 

~~~~

 

Naturalmente, os pais de Irene quiseram saber quais eram as perspectivas da filha quanto ao futuro. A mãe foi quem se encarregou do assunto.

- Filha! Senta-te aqui que quer conversar contigo!. – Pediu um dia de manhã.

- Quer conversar comigo? Olhe!. Se é acerca de namorados, não estou interessada!. -  Respondeu Irene com alguma aspereza.

- Até podia ser!. Pensas que isso não me preocupa?!. Fica a saber que me preocupo e muito!. Mas, quanto a isso, tu é que sabes!. – Replicou a mãe.

- Oh! Mãe! Eu sei que sim!. Mas o que é que eu posso fazer?. Não tem dado!. Pronto! – Respondeu Irene.

Bem!. Tu é que sabes, repito!. Mas não é disso que te quero falar!... Quero é saber o que pensas fazer da tua vida; que perspectivas tens para o futuro; Se já tens alguma coisa em vista!... Essas questões que se põem a todos os estudantes quando terminam os seus cursos!... Sei que tens uma boa nota!. E, também sei que por vezes surgem boas oportunidades!. – Disse a mãe

- Olhe, mãe!. A resposta é muito rápida e simples: A única certeza que tenho, é que tenho de voltar para Lisboa, se quiser iniciar a vida profissional!. Não sei a fazer o quê!. Mas, alguma coisa hei-de arranjar!. Digo Lisboa, porque é lá que tenho mais hipóteses – Respondeu Irene com toda a sinceridade.

- Mas, tens algo em vista?. Vais concorrer alguma coisa; A alguma empresa?. – Continuou a mãe.

- Tenho. Em primeiro lugar vou procurar patrono. Isto é, fazer um estágio para poder inscrever-me na Ordem dos Advogados e poder exercer advocacia!. Não me parece ser difícil devido, efectivamente, à boa nota que tenho!. Mas, isso não depende só de mim!... A minha intenção é regressar logo no inicio de Setembro!. Daqui a quinze dias, portanto! – Esclareceu Irene.

Bem. Já é alguma coisa!. Deus queira que tenhas sorte!... E, o que pensas fazer em relação a estadia?. – Quis saber a mãe.

- Para já, vou continuar em casa dos tios!. Já falei com eles e não se importam!... Evidentemente, que verei novamente a situação logo que tenha alguma estabilização!... Espero que não demore!... Mas, isso só o futuro dirá!. – Respondeu Irene.

Irene mostrou à mãe que estava atenta. Se ainda estava em Vale do Seixo, devia-se ao facto do mês de Agosto ser um mês frouxo devido às férias. Sabia que só a partir de meados de Setembro é que a actividade voltava ao normal. Assim sendo não adiantava regressar a Lisboa mais cedo.

Enganou-se!. No dia seguinte à conversa que teve com a mãe, recebeu uma carta do tio Teófilo. Estranhou. Não esperava correspondência naquela altura. Abriu o envelope e para sua surpresa, dentro, em vez de carta do tio, vinha um oficio de uma Sociedade de Advogados, bem conceituada no mercado, a convida-la para lá fazer o estágio: Sabemos que finalizou o curso de Direito com nota relevante, convidamo-la a estagiar………………………  Se for do seu interesse … terminava!. Nem queria acreditar no que estava a ler. – “Se for do seu interesse” – Repetiu mentalmente Irene!. – Vindo desta sociedade, é o mesmo que perguntar a um cego se quer ver! – Disse para consigo. Pulou de contente e correu a dar a noticia aos pais. Ficaram tão surpresos, quanto a filha!.

- Graças a Deus! – Exclamou a mãe

- Que comeces em boa hora! – Desejou o pai.

- Bem! Sendo assim, o melhor que tenho a fazer é arrancar já amanhã para Lisboa! O que é que acham?.

- Nem hesites, filha!. Oportunidades destas, não devem aparecer todos os dias!. Tens de a agarrar com unhas e dentes! – Pressionou o pai.

A mãe ficou pensativa, no momento, e logo que a filha se afastou comentou com o marido.

- Oh Manel! Esta partida da Irene não te parece diferente de quando ia para as aulas!?

- E é!. Então se vai começar a trabalhar!. - Respondeu o marido sem entender a intenção da observação.

- Sim. Mas eu não quero dizer nesse sentido!. Quando ia para as aulas, sabia que passados três meses regressava!. E, agora?. Só quando tiver férias?. Virá cá mais vezes? Menos vezes? – Esclareceu a esposa denotando alguma angustia.

- Tens razão!. Não pensei nisso!. Mas, é mais que certo que vai vir cá menos vezes!. Por um lado é bom sinal!...... E, daqui a dois anos, se Deus quiser é o Rui!. – Lembrou o marido.

- Pois é!. Já me tinha lembrado!... Não tarda, ficamos para aqui sozinhos!...

- Não te preocupes com isso agora! Não sofras por antecipação!... Deixa os garotos estabilizarem, depois logo se vê!. Se virmos que nem um nem outro apontam para estas bandas, vamos nós para perto de um deles!... – Respondeu o professor Gião.

- É isso mesmo!. Vamos esperar e depois logo se vê!. – Arrematou a professora Barbara.

No dia seguinte, tal como tinha decidido, Irene rumou a Lisboa para iniciar a sua vida profissional.

publicado por jcm-pq às 12:09
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